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terça-feira, 30 de agosto de 2011

AS ASSOCIAÇÕES CRISTÃS E SEU PAPEL NA PERIFERIA URBANA: UMA ABORDAGEM SOCIOLÓGICA

O fator religioso é um dos principais agentes transformadores da sociedade. Hoje no Brasil não é possível fazer uma analise social sem levar em conta a participação da religião, principalmente as pentecostais históricas quanto as “neopentecostais” .

No entanto, para entendermos os aspectos positivos e negativos dessas ações e necessário avaliar os pressupostos axiomáticos que estão como forca motora dessas atividades. Os atos são efeitos de uma convicção, elaborada numa formulação teológica. A proposta dessa reflexão é fazer uma analise dos pressupostos como causa para as ações sociais efetivas da religião cristã na periferia urbana.

A valorização da pessoa como individuo

A contribuição da religião na periferia urbana tem sua gênese no axioma teológico da bíblia no Antigo Testamento. Já nos livros do Pentateuco havia uma preferência para com os pobres, desvalidos, as pessoas excluídas da sociedade. O oficio do messias era um ministério primariamente que se voltava para os pobres: “Levar boas noticias aos POBRES, anunciar LIBERDADE AOS CATIVOS” (Isaias 61.1).

O êxito da religião evangélica está no fato de que na sociedade, a condição financeira determina a aceitação das pessoas nas redes sociais. Ele só poderá se relacionar de acordo com sua estrutura sócio economica.
A religião cristã proclama uma mensagem sociológica inclusiva, visto que esta fundamentada toda ideologia na seguinte premissa: “Todos os homens são criaturas de Deus”, por isso, as diferenças sociais não são relevantes diante do criador que vê todos de forma igual.

A religião cristã oferece uma proposta que torna se irrecusável, após a consciência de criatura universal, prossegue: “Mas você pode ir mais longe, pode tornar-se filho de Deus ao “aceitar a Jesus como salvador”. Isso significa que a pessoa que estava excluída da sociedade, agora passa a ter uma “família”, onde “Deus” é o “Pai” e todos os participantes da comunidade se consideram “irmãos”.

Essa construção sem duvida torna-se o primeiro beneficio para a sociedade, pois o individuo, de excluído que muitas vezes não tem sequer uma família, ganha um senso de pertencer, ser amado, há uma mudança sintomática na sua vida. As ações efetivas na sociedade são reflexos do poder dos laços criados a partir da inserção da pessoa na comunidade de fé, visto que elas ganham senso de autoridade.

Essa realidade e descrita por BAUMAN, 2010, p. 76: "Assim os fatores unificadores são valorizados como mais fortes e importantes do que qualquer coisa que possa causar divisões, e as diferenças entre os integrantes, são secundarias em relação as similaridades”.

A religião cristã ressalta o valor da individualidade ao mesmo tempo em que a coletividade o imerge numa dimensão reflexiva de respeitar princípios que estão além de si, pertencem a um bem maior da comunidade.

A solidariedade social como o reflexo da valorização do individuo

As ações sociais governamentais buscam obras que venham abranger um bem coletivo, visam a comunidade numa forma geral, buscando na medida do possível atuar na esfera das necessidades básicas. Contudo muito pouco ou quase nada, fazem para outra dimensão do individuo na sociedade que é a necessidade de "pertencer", da "auto-imagem", de valores que transcendem ao ser humano.

Quando uma pessoa chega na igreja e se "converte" a fé cristã, logo os cooperadores da igreja anotam seu endereço e fazem constantes visitas, ao perceberem que ele precisa de alimentos, ou qualquer outra coisa básica para a sua subsistência logos dão um jeito de tirar ofertas entres os irmãos da comunidade para suprir as necessidade mais básicas da pessoa. 

Contudo a  ajuda maior está na mudança de cosmovisão, a pessoa passa a sacralizar o tempo e o espaço. Tempo porque ele passa a crer que agora há um propósito de “Deus” para sua vida, e o espaço também passa a ser sacro, pois "aquele momento" que está no templo, está fora do “dia normal”, o fiél entra nele e nesse "momento", ele resignifica todos os outros momentos, como se recebesse uma carga energética.

O cristão sente-se o protagonista da sua historia, não apenas um "ser" que vai passar, passa a ter  perspectivas que vão além, uma cosmovisão de continuidade e não de finitude. Essa realidade e bem expressa por Leonardo BOFF, 1980 p.65: “Essa fé cria uma mística que não foge nem teme a perseguição, a prisão a tortura e a morte, porque ela liga a pessoa a um absoluto. Mas insere dentro da normalidade da vida de fé na cruz de Jesus Cristo”.

          Status: "Ser" como primazia sobre o "Ter"

A sociedade capitalista tem como premissa básica o acumulo dos bens, automaticamente exclui os indivíduos de baixa ou sem renda. Todas as exigências para se obter um status na sociedade e irrelevante na comunidade cristã. A pessoa torna-se integrante de uma família, ter uma inumerável quantidade de “irmãos na Fé” eleva a sua estima pelo fato dos valores do capitalismo estar no “Ter”, enquanto na religião Cristã esta no “Ser”.

Há uma inversão epistemológica na maneira de refletir a vida, o “Ser” tem primazia sobre o “Ter”. O primeiro passa a ser o Status maior, o segundo torna-se efeito de como ele vai se relacionar com o seu “Deus”. A partir daí ele ganha condições para se ver diferente, ao mesmo tempo em que suas ações vão refletir na sociedade.

A vida religiosa com movimento em direção ao outro

A vida religiosa parte do principio que há necessidade de valorização do individuo, o insere numa “família” que forma uma comunidade de pessoas que agora tem um alvo, por em pratica a ética de Jesus relatada no evangelho, o que significa uma participação mais ativa na rede solidária com o outro. As ações legitimarão o direito dos fiéis entrarem no reino eterno. O julgamento final e descrito como uma reunião de todas as nações onde haverá uma separação entre “ovelhas” e “bodes” em lados opostos.

O cenário é descrito com o rei que dirá para os fiéis vir receber por herança o que foi preparado, isso em razão de terem sido solidários com os excluídos: “Pois eu tive fome; e vocês me deram de comer; tive sede, e vocês me deram de beber; fui estrangeiro e vocês me acolheram; necessitei de roupas e vocês me vestiram; estive enfermo e vocês cuidaram de mim; estive preso e vocês me visitaram.” (Mateus 7.35,36). As pessoas são chamadas de justas e perguntarão quando foi que fizeram isso ao rei, visto que não fizeram pessoalmente a Ele? (Mateus 7. 37-39). A resposta é: “O que vocês fizeram a algum dos meus menores irmãos, a mim o fizeram” (Mateus 7. 40).

Essa e uma condição sine qua non para se alcançar o objetivo proposto pela fé cristã, ou seja, a ação solidária não é uma opção, mas um dever, visto que a isenção do cristão leva-o a exclusão do futuro reino, além de o descaracterizar como cristão, seria o mesmo que ignorar o próprio rei que se coloca no lugar dos marginalizados se identificando com eles: “O que vocês fizeram a algum dos meus menores irmãos, a mim o fizeram” (Mateus 7. 40).

O exclusivismo: O aspecto negativo

Se por um lado o fato de ter um absoluto, da sentido a vida na religião cristã, paradoxalmente esse fato que traz benesses, também e responsável por um dos mais graves problemas: O exclusivismo como gerador da intolerância; isso acontece devido aos axiomas teológicos que permeiam toda a reflexão cristã. Esse exclusivismo tem sua origem na definição do conceito de "verdade".

          A verdade metafísica, fora do corpo e da historia

O que e a verdade? Essa e a gênese de toda a intolerância religiosa, o cristão normalmente se envolve em conflitos quando responde a essa pergunta. A reflexão cristã tem seus postulados na filosofia grega, a verdade é a concordância entre “sujeito e objeto”, produto da “contemplação”. A verdade tem sua gênese na “teoria”, a “práxis” é apenas o efeito é legitimada pela teoria.

A verdade pronta, nasce na “razão” por isso é “eterna e imutável”. O cristão precisa conhecê-la através da interpretação bíblica, e viver de acordo com ela, o que é chamado de “revelação”. Essa “revelação” para o cristão e metafísica, não leva em conta o tempo, a historia e as situações contingências. Na cosmovisao grega o sujeito precisa interpretar o mundo, a verdade e estática, diferente da teoria marxista onde o homem precisa transformar o mundo, a verdade é dialética, e provisória.

A “verdade” é produto do conflito entre o homem e sua luta pela sobrevivência, portanto nasce no corpo. Na teologia cristã a verdade nasce do "espírito, alma, razão", fora do corpo. Essa forma de refletir é prejudicial por produzir dois tipos de reducionismo: O religioso e o Político.

                    Reducionismo religioso

Se a “verdade” esta circunscrita a esfera da hermenêutica com pressupostos nas doutrinas herdadas da tradição, logo, todos os que não pensarem dentro desse circulo, não estão com a “verdade”, assim as demais religiões que professam um credo diferente, são alvo de uma “conversão”, o que causa conflitos.

O que foi positivo para inserir o individuo na comunidade, torna-se a causa geradora de conflitos na comunidade, principalmente com os familiares, pelo fato que agora ele vai lidar com categorias de "sagrado" (tudo que se relaciona com a fé) e "Profano", (tudo o que não relaciona com a fé, chamando de "mundo"). Nessa óptica, a experiência só e legitimada a partir da aceitação da “fé crista”. Esse e um caso muito claro na relação entre católicos e cristãos evangélicos, na reforma protestante (1050 - 1500 d.C). Há certa animosidade quando a pessoa sai da "fé católica" e se "converte" a fé cristã, há rupturas e afastamento por parte do novo fiél da fé evangélica.

                    Reducionismo político

O reducionismo político e outro efeito da herança teológica neoplatônica inserida nas interpretações dos chamados pais da igreja primitiva, século IV d.C. Agostinho praticamente determina o curso da reflexão teológica da igreja, seu pensamento dicotômico herança da filosofia grega estabelece um pensamento dualista, de dois mundos em oposição.

A política foi interpretada como uma dimensão antitética, “secular” e, portanto, em oposição ao “sagrado”, isso fez com que a igreja Cristã de origem protestante, se relacionasse com a política de forma alienada, não e sem razão que Marx a nominou como “ópio do povo”.

A religião atuou com um anestésico frente ao poder da classe dominante. O catolicismo embora tenha uma postura política mais engajada, pode se dizer que foi omissa na maior parte da historia e ainda usou a teologia como meio de legitimar a dominação com uma hermenêutica tendenciosa a favor dos ricos.

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REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAUMANN, Zigmunt. Aprendendo a pensar Sociologicamente. Rio de Janeiro-RJ. Zahar 2010.

BOFF, Leonardo. Teologia do cativeiro e da Libertação. Rio de Janeiro-RJ. Ed. Vozes 3ª Ed. 1982.

ALVES, Rubem. O suspiro dos Oprimidos. Ed. Paulus. São Paulo - SP. 6ª Edição 2006.