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segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Culpa: o desamparo do homem na Teologia Cristã.


A explicação do totemismo para a origem da culpa, na humanidade de que a morte do Pai da horda reflete no inconsciente racial e cria o contínuo sentimento de culpa, adota a hipótese de que os israelitas mataram Moisés e que essa morte é a repetição da morte do pai primitivo, “Esta morte fez o grande crime real para os israelitas, se bem que, permanecendo profundamente sepultado no inconsciente racial, aumentou o sentimento de culpa, que continuou a perseguir os filhos de Israel”[1]

A teoria da origem da culpa na psicanálise como sendo “a desobediência do filho e a sua afeição pelo pai, até a conspiração para a sua morte”, tem a sua conclusão de que a infelicidade do homem veio pela culpa da morte do pai. Dando continuidade a esse raciocínio, Freud concluiu que a doutrina do pecado original se tornou chave na igreja primitiva, devido simbolizar o nível inconsciente, o assassinato do pai da horda primitiva. A salvação do pecado original só pode ser alcançada através de uma morte expiatória, por isso ele conclui:

“A doutrina principal é a reconciliação com Deus Pai, a expiação do crime contra ele; mas o outro lado da relação se manifesta no Filho que tomou sobre sí a culpa, tornando-se Deus ao lado do Pai, o cristianismo torna-se uma religião do filho. Não pôde escapar ao fato de destruir o Pai de suas funções”.[2]

Na teologia Cristã quem mais perdeu foi o “filho”, pois surge o sentimento de forma negativa o “medo” [3], no entanto o relato da história é que o Pai, busca a comunhão perdida com o filho, (homem) e culmina com a redenção através do seu Único Filho, (unigênito), que veio restabelecer a paz que havia sido rompida com o ato de desobediência do primeiro homem. “Vindo à plenitude do tempo Deus enviou o seu único filho, nascido de mulher, nascido sob a lei”. [4]

A teologia cristã é a única que apresenta a ressurreição como ápice final na conclusão do processo redentivo do homem. È interessante que no totemismo freudiano, a culpa dificilmente será redimida pela humanidade, pois o que poderá ela fazer para eliminar esse complexo? O simbolismo da psicanálise de que o filho matou o pai, fala da culpa que agora ele terá de conviver, no entanto não há solução em como se livrar da culpa.

A teologia cristã admite certa “morte”, do homem através da separação do seu criador (pai), foi essa a advertência feita ao homem (filho): “E o SENHOR Deus lhe deu essa ordem: de toda árvore do jardim comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás”. [5]

Embora haja paralelo no relato bíblico da criação de que a “morte” do pai pelo filho, causado pelo desejo do filho em ter algo que o pai tinha, “Ser igual a Deus, (pai) obtendo através de comer o fruto da arvore da ciência do bem e do mal”. Há um fator que no cristianismo difere, a advertência feita pelo pai como um fator que preservaria a vida do homem (filho), e não no egoísmo do Pai em ter para si algo que despertou cobiça e revolta no filho.

A cobiça é comum nas duas narrações, tanto do relato totêmico quanto da criação, no entanto as motivações do pai, é que diferem, pois enquanto o pai, na psicanálise se mostra egoísta, o da criação se mostra altruísta. Enquanto a “morte” é o ponto comum entre os dois, como único meio para que o homem (filho) obtenha o seu objeto de desejo, as intenções diferem. Qual seria então a proposta para que o homem se livre dessa culpa?

Na psicogênese da religião segundo a psicanálise, o estado de culpa que o homem vive é o que produz a necessidade da religião, e que o amadurecimento transportará o homem da fase da infância para a fase adulta, e a maturidade extinguira a religião, por essa se fazer necessária devido à infantilidade do homem, tanto individual, quanto coletiva, se tratando da humanidade, os conflitos infantis têm duplo sentido; sobre essa teoria comenta o teólogo católico Hans Kung:

“Conflitos infantis tem duplo sentido: da infância do individuo humano e da infância da espécie humana; conflitos, portanto, já dos primeiros tempos da humanidade, pois a infância do individuo é na verdade uma imagem da infância da humanidade, a ontogênese do indivíduo humano é uma reprodução da filogênese da espécie humana! Em ambos os casos a raiz das necessidades religiosas é o desejo pelo pai, em ambos os casos o papel central é representado pelo complexo de Édipo”.[6]

Nos tempos em que essa teoria foi elaborada, havia uma perspectiva positiva quanto a essa maturidade como uma formula para que o homem ficasse livre de suas neuroses, no entanto, os tempos têm mostrado que a religiosidade no homem é um fenômeno universal, e nem a pós-modernidade tem livrado o homem dessa inquietação, dessa “infantilidade”.

O homem continua tão neurótico quanto nos tempos que foi elaborada essa teoria, o cristianismo parte do pressuposto que o homem é um ser espiritual, como criatura tem a Imago Dei (Imagem de Deus), e somente com uma re-ligação entre ela e o criador, dará a liberdade do Ser, como livre da neurose, isso porque “Há um vazio profundo, um buraco imenso dentro do seu ser, suscitando questões como gratuidade e espiritualidade, futuro da vida e do sistema terra. Esse buraco existencial é do tamanho de Deus, por isso só Deus é capaz de preenchê-lo”.[7]

_______________________________
Notas
[1] Rosa Merval. Psicologia da Religião. Ed. JUERP. 1979. p. 62
[2] Idem.
[3] Gênesis 3:8 Narra que o sentimento de afastar-se do pai, produziu insegurança, mais tarde Freud, faz mais uma correlação com a teoria do estado de infância da religião, como um processo de infantilidade da raça humana, que posteriormente com a maturidade perderá todo o sentido de existir.
[4] Gálatas 4:4.
[5] Gênesis 2 16-17
[6] Hans Kung. Freud e a Questão da religião. Ed. Verus. 2006.p. 41
[7] Leonardo Boff. Espiritualidade - Um caminho de transformação. Rio de Janeiro. Ed. Sextante 2001 p.12

8 comentários:

  1. Olá J.Luiz, tudo bem. Quer dizer que você é amigo do insano do Gresder rssss

    Dei uma olhada rápida nos textos que estão aqui e achei os temas bem interessantes; como estou me preparando para viajar e ficar 3 dias fora do Rio, vou deixar para lê-los com calma quando eu voltar.

    Fique a vontade lá na minha Sala e vou seguir o teu blog que está apenas iniciando mas que também promete!

    abraços calorosos

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  2. Caraca... agora sim o negocio ta bom J.lima, e mesmo eu não gostando de textos grandes esse foi excelente, e confesso que não estou a altura para dialogar contigo, mas eu vou te apresentar um Medico conhecedor da psicanálise, “discípulo” de Jung.

    Quando você postar um texto deixa ele pelo menos por uns cinco dias para os outros terem tempo para ler, pois geralmente a gente cria amizade e le vários textos por semanas.

    Olha que eu nunca tinha visto a coisa por essa ótica, mas começando com o Levi e suas analises psicanalítica e agora você com esta mesma abordagem da questão me deixou meu que encafifado, será que eu vou ter que ler Freud e Jung como leitura obrigatória.

    Bom esse herege do Eduardo ai também gosta destes caras e do Boff também, já é um bom ponto de contato para vocês começar uma boa amizade e debate caloroso.

    Abraços e volto sempre...

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  3. Olá Zé Lima meu irmão! Seja bem vindo à nossa esfera blogueira (ou blogosfera para os mais chegados)Rsss

    Seu artigo embora seja de um tamanho assustador, é de fácil leitura (parabéns pela técnica literária)

    Vou ler mais alguns textos e posteriormente comentarei.

    Endossando o que o Gresder falou, o Levi o Eduardo, e até o Marcio, estão mais aptos para argumentar contigo...mas logo logo eu e o mano Gresder estaremos "afiados" em Freud, Jung e Boff também. Os livros estão na fila pra leitura.

    Abração e Desculpe pelo "Zé", é só pra descontrair.

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  4. Prezado José Lima

    Quero, também, dar-lhe as minhas boas vindas.

    Senti-me realmente gratificado ao ler dois dos seus artigos. Achei-os de uma leveza e lucidez fora de série.

    Acredito que a psicanálise bebeu muito da fonte do cristianismo, e agora, é mais do que hora, dela prestar algum tipo de serviço, no sentido de resgatar a religiosidade da frivolidade sem sentido dos dias atuais.

    Como você bem sabe, ainda que a psicanálise não ensine nada ao teólogo que ele não possa saber através das Escrituras, ela o ajuda a se colocar de volta na linha do Evangelho.

    Que 2010 seja um ano de muito intercâmbio entre nós, e que tudo concorra para o nosso crescimento espiritual.

    Tenha um Ano Novo de paz e saúde junto com os seus.

    Levi B . Santos (http://www.levibronze.blogspot.com)

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  5. Caro J.Lima


    "O simbolismo da psicanálise de que o filho matou o pai, fala da culpa que agora ele terá de conviver, no entanto não há solução em como se livrar da culpa".

    Concordo com a metáfora "O Filho matou o pai". Mas para mim isso significa que em Cristo morreu a forma de agir do Deus Vétero Testamentário, que contra o próprio Pai, fez de nós míseros pecadores seus irmãos.
    No final, a figura do Deus morto, isto é, desparecido da mente de Cristo (Ele se sentiu abandonado), reapareceu como a "Culpa" ou "assumir de culpa", quando ele voltou atrás e disse: "contudo seja feita a vossa vontade". Jesus renuncia a sua vontade para abandonar-se nas mãos de um Pai que nada pode sem o consentimento de seu Filho (O Pai está morto, e passará a ser adorado simbolicamente)

    Um Pai esvasiado de sua potência(simbolicamente morto)é entregue e abandonado às consequências felizes ou infelizes da liberdade e dos desejos humanos.
    Segundo essa formulação mais espiritual que teológica,o cristianismo começa com o luto de Deus.
    O grande problema é que, de quando em vez, nos aparece a imagem do Deus Pai ameaçador, e nos sentimos culpado.

    "Tudo está consumado!"

    A partir de agora, como irmãos do Filho mais velho(Cristo) que assumiu sobre si toda a responsabilidade de nossas vicissitudes, nos resguardamos da culpa.

    Cristo erigiu a liberdade, na horizontalidade da fraternidade. O ser humano age e arrisca, sem que o Deus Vetero Testamentário o castigue pela falhas de seu caminhar existencial.

    Parabéns pela interessante abordagem psicanalítica e religiosa da CULPA.

    Ainda vou refletir mais sobre este seu denso e significativo texto.


    Saudações cordiais,


    Levi B.Santos

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  6. Levi.
    Tenho que reconhecer que você está muito acima do meu conhecimento de psicanálise...rsss
    Você pegou o mesmo tema e conseguiu não só ampliar mais mostrar um angulo que sinceramente eu não tinha visto!
    Foi legal essa análise de Cristo, como "desamparado",que aliáis para min não é uma figura de linguagem como quer os teólogos ortodoxos, para min ele literalmente foi "desamparado", mas como admitir isso entraria em conflito com a divindade em sua natureza, os teólogos preferem atribuir como uma figura.
    A sua análise sobre a "ressureição" da imagem do Deus do Antigo Testamento é tão real, que sinceramente acho que para a maioria ele não re-surge, pois nunca deixou o cenário do "incosciente coletivo cristão"!rssss
    Abraço.

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  7. Oi J.

    Coincidentemente, nesses últimos dias tenho estudado o livro Totem e Tabu do Freud. Pelo pouco que já li, creio que sua teoria freudiana é válida dentro de certos parâmetros, mas como dizia Jung, o Complexo de Édipo não pode explicar tudo.

    Prefiro ver no relato bíblico do Gênesis, não a vontade de matar o pai, mas sim de ter algo que o pai possuia e lhe negava: o conhecimento.

    Mas porque será que Deus reluta tanto em dar o conhecimento ao homem? ou Deus iria permitir que ele o tenha posteriormente?

    É melhor viver na inocência e estar cego para os dramas universais que ocorrem ao nosso redor?

    Um comentário rabinico diz que na verdade Deus não queria privar o conhecimento do homem, e sim, impedí-lo que ele o possuísse sem nenhum esforço.

    Mas enfim, o homem "rouba" o conhecimento da divindade, abre a caixa de pandora e agora, o próprio fato dele conhecer o mal faz com que o mal seja produzido em escalas ascendentes.

    A solução que Deus acha para acabar de vez com o mal que o conhecimento traz, ele decide acabar com sua criatura.

    Mas, surpeendentemente, ele salva Noé...

    Por que?

    Será que Deus agora tinha a ilusão de que os descendentes de Noé saberiam enfim, usar o conhecimento que possuiam para o bem?

    ...

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  8. Então, a culpa do homem não seria por ele não ter conseguido usar o seu conhecimento somente para o bem?

    Deus, apesar de tudo, apesar do extermínio quase total, poupa Noé. Deus estava iludido por achar que depois do castigo os descendentes de Noé saberiam enfim, usar o conhecimento?

    O cristianismo impingiu nas mentes das pessoas que elas são culpadas. Culpadas de que? culpadas de serem filhos de Adão...Mas ora, se foi Adão que roubou o conhecimento de Deus, porque eu tenho que ser culpado de qualquer coisa?

    E na verdade Deus já puniu o homem pelo roubo no dilúvio. Mas já que resolveu poupar Nóe, que culpa tenho eu que sou agora, filho de Noé?

    putz, J., meus pensamentos são ordinários mesmo, cá estou eu, sem querer, criado novas hipóteses para a culpa..rsss

    Bem, vou parar por aqui...por enquanto...

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