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segunda-feira, 15 de março de 2010

Religião: Sentido e Neurose

A religião realmente tem causado uma opressão psicológica no homem, pois alguns fenômenos são espiritualizados, hoje se percebe que as causas de muitas manifestações tiveram sua origem não nos “espíritos”, mas na pressão psicológica com leis rígidas, onde o homem confrontado com as exigências da divindade criou um estado de “síndrome do pânico” conseqüências do terror diante da possibilidade de infligir alguma lei, do “Deus”, exigente!

Afinal que final poderá ter quem “desobedecer”, aquele que está “com os olhos como chama de fogo”, um verdadeiro teatro de horror, onde não há alternativa, a obediência irracional é o único meio de manter aplacada sua a ira!

Jesus encontrou esse sistema no seu tempo, veja a situação de uma mulher oprimida pela religião que se propõe re-construir a relação humanidade-divindade, mas diviniza a hierarquia e des-humaniza o homem na qual se propõe elevar:

“Jesus estava ensinando numa das sinagogas no sábado. E estava ali uma mulher que tinha um espírito de enfermidade havia já dezoito anos; e andava encurvada, e não podia de modo algum se endireitar. Vendo-a Jesus, chamou-a, e disse-lhe: Mulher estás livre da tua enfermidade; e impôs-lhe as mãos e imediatamente ela se endireitou, e glorificava a Deus. [1]

Esse texto mostra a cura efetuada por Jesus, fala de um “espírito de enfermidade”, a crença na teologia é que há espíritos que influenciam na vida do ser humano, embora não seja empiricamente provado, não há porque contestar, visto que a religião atua no âmbito da fé.

No entanto o fato de andar encurvada, não significa que foi uma “ação imediata” desse espírito, ela estava nesse estado há dezoito anos. Uma leitura mais analítica desse texto poderá revelar alguns fatores psicológicos, na vida dessa mulher:

- Estava na sinagoga, pertencia à religião judaica da qual é a gênese do cristianismo, que culpava a mulher pela desgraça de adão e conseqüentemente da humanidade.

- A lei é reconhecida como boa e perfeita mesmo assim produzia que culminava em opressão. Como algo que veio para o bem ser transformado em algo tão maligno?

- A religião como produtora de sentido da vida, transformou uma mulher, chamada por Jesus de filha de Abraão, prisioneira durante dezoito anos num cárcere psicológico será que a pressão da mente não encurvou o seu corpo? (psico-somático?).

- Os interpretes colocavam o dia de sábado como “sagrado”, onde não poderiam exercer nenhum trabalho, mas Jesus cura a mulher justamente nesse dia, e essa foi à queixa do chefe da sinagoga, porque será que eles valorizavam mais o dia do que as pessoas, mais a liturgia do que o ser humano?

- Jesus os censurou que eles ao tirar uma ovelha para alimentá-las, estavam trabalhando, na realidade eles não relativizavam o conceito do que é “trabalho”. Isso mostra um ritualismo, com inversão de valores?

Dentro desse arcabouço, vemos que a situação da mulher foi um processo que culminou na opressão psicológica, e não uma “ação imediata”, uma possessão, há muitas pessoas que à semelhança dessa mulher, estão dentro do templo, com “opressão psicológica”.

Neurose causada pela culpa de conceitos deturpados, e ai ao atingir o ápice, a personalidade é totalmente aniquilada dando espaço para o “outro opressor” mesmo alegando ser o templo de Deus, outro “deus”, habita no seu templo, um deus que despersonaliza, anula o individuo fazendo o viver num estado neurótico.

Isso me faz refletir:  "A religião é a maior produtora de sentido, paradoxalmente, é também  a maior produtora de neuróticos..."
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Notas
[1] Lucas 13:10-17
[2] Salmos 19: 7 Romanos 7:16

9 comentários:

  1. Carissimo Professor Jose Lima;

    É com muito prazer que venho comentar em primeira mão este texto instigante, revelador e libertador. Visto que liberdade é a busca incessante do nosso ser.

    A religião surge como a chave que nos abrirá as portas, mais só até nos vermos inceridos dentro da religião, então as portas se fecham e não podemos sair para fora, onde esta a liberdade? Liberdade que não precisou da religião (sistema de leis humanas) para ser alcançada, pois esta é inerente do ser.

    A unica lei exigida por Deus a sua criatura é que o amemos sobre todas as coisa e nos amemos uns aos outros como se fosse-mos um. Ainda que isto não venha ser uma imposição, visto que o amor não aprisiona e nem se obriga.

    Amor é natural de Deus e um dom dado aos homens.

    Forte abraço.

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  2. Caro J. Lima

    Mais um texto empolgante, esse
    sobre Religião: Sentido e Neurose

    Os doentes de neurose compulsiva exibem rituais, até certo ponto semelhantes aos dos religiosos. Por exemplo:

    A pessoa cuja vida está sob o peso de sentimento de culpa e subsequente necessidade de expiação, pode exprimir esses fatos emocionais através da compulsão de lavar as mãos constantemente.

    Não raro, os seguidores dos cultos religiosos adotam o ritual de limpeza obsessiva. Os sistemas de valores para julgar as pessoas são no mesmo sentido: "limpeza e ordem".

    Assim como o neurótico que lava as mãos por compulsão, os que executam o culto centralizado nos cerimoniais ritualistas para livrar-se do mal, encontram segurança na observância estrita de mandamentos ritualísticos internalizados.

    Por outro lado, no esquema da religião humanista, Deus aparece como símbolo dos próprios poderes humanos, e não como símbolo de força e dominação, escravizando o homem pelo seu poder.


    Abçs,

    Levi B. Santos

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  3. J. Lima

    O seu significativo texto, levantou uma questão recorrente e inerente nas religiões, o paradoxo entre oferecer sentido ao mesmo tempo em que aprisiona o sujeito em uma neurose.

    Existem pessoas que se forem tiradas dela a religião, eles perdem o chão existencial de suas vidas, caminhando sem rumo e sem sentido, mas por outro lado, cada vez que se vai aprofundando na religião, seguindo suas ordenanças e rituais, vai se afundando no lamaçal da neurose culpabilizadora, realmente é um paradoxo sem fim e sem aparente resolução.

    Apesar das pessoas estarem sendo escravizadas pela religiosidade recorrente, elas vão encontrando sentido de existência ao mesmo em que se sentem valorizadas, isto de certa forma gera uma ilusão de segurança e alegria, que conforta ao mesmo tempo em que é uma fuga existencial, uma mascara sobre a feiura e o medo da vida.

    Mas é também extremamente prejudicial, pois aprisiona a pessoa, que muitas e não poucas vezes, se sente oprimida e presa no sistema religioso, onde é impelida a fazer ao mesmo tempo em que deixa de fazer outras tantas coisas, pela neurose escravizante da religião.

    O nosso grande problema é que tiramos o tapete existencial, mas sem oferecer uma outra coisa em seu lugar, é assim que eu sinto-me, depois que abri mão do conforto ilusório e passageiro da religião, me vi sem chão, e ainda me vejo, tendo que eu mesmo construir o sentido da minha existência sem mecanismos e sem pretensas seguranças.

    Literalmente sai da gaiola, para alçar voos pela floresta escura e insegura da vida, mas é melhor assim, fazendo o meu próprio caminho, do que os confortáveis e ludibriadores caminhos da religião.

    Abraços

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  4. Professor, a afirmativa ao final do seu texto é a "mãe" de todos os paradoxos: a religião dá sentido. A religião neurotiza.

    Eu creio que a religião ainda seja muito importante para o homem, pois este, jamais deixará de ser religioso.

    Mas creio que todas as grandes religiões precisam se reinventar. Precisam se criticar. Precisam reformular seus absolutos. Precisam saber aceitar o outro, o diferente. Precisam entender que seus símbolos são apenas símbolos e não a explicação última, absoluta e verdadeira da espiritualidade.

    O Cristianismo, em particular, em poucos anos deixará de fazer sentido para grande parte da humanidade. Aliás, ele ainda faz algum sentido para nós?

    E para quem já conseguiu fazer essa síntese da relativização dos símbolos, não sentirá falta do padrão organizacional e burocrático do cristianismo atual.

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  5. Jair concordo com você alíais a religião na psicanálise é explicada como uma "necessidade de resposta ao terror da finitude", e a partir dai busca-se segurança, mas viver é sinonimo de insegurança, de riscos.

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  6. Marcio.
    cremos que é bom sair da gaiola, mas porque será que muitos não querem sair? creio que a resposta está em que podemos ser "presos na gaiola", mas também ser presos por não "estar na gaiola".

    Acho que muitos preferem a gaiola da religião, porque se por uma lado ela aprisiona, por outro ela oferece uma "segurança", ou pseudo-segurança que não há fora da gaiola.

    Quem está na "gaiola", pode viver até mais feliz do que quem está "fora da gaiola", pois a óptica de quem está dentro, não é de que "está dentro", só que está fora, consegue ver quem está dentro!

    Ou seja a consciência de quem está dentro só é percebida por quem está fora, e uma coisa há de positivo na gaiola, que é a "sensação de segurana", coisa que quem está fora não experimenta essa sensação.

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  7. Levi.
    Mais uma vez você vai além...
    Não vejo a hora de postar artigos que tenha a ver com psicologia, para ler os seus comentários que sempre me trazem novos conhecimentos!

    Fantástico essa colocação da "sindrome de limpeza", exteriotipada pelo "lavar as mãos"!

    Me lembrei do conflito de Jesus com os fariseus sobre esse ritual, que agora vejo como uma "projeção", uma assepsia no "exterior", como ventilação inconsciente da "sujeira que estava no interior"!

    "nascer da água", na fala de Jesus, certamente estaria falando da vida que tem sua origem na água, sinonimo de limpeza, por isso o novo nascimento fala de ruptura, começar de novo.

    Os ritos da religião tenta lavar o homem, mas certamente é um "desejo inconsciente" de ficar limpo, tirar toda maldade e contradição da ambiguidade humana.

    Essa sua frase da neurótico que lava as mãos, dá um artigo fenomenal! Alías sou apaixonado pela psicologia do inconsciente, acho fantastico de que a realidade dos nossos atos, são em sua maioria manifestações inconscientes do nosso ser!

    Abraço!

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  8. Eduardo.
    Você tem razão quanto ao cristianismo.
    Hoje em algumas vertentes já tornou-se insignificante.

    Por outro lado enquanto o cristianismo do Cristão está em queda, o cristo do cristianismo está em alta.

    Não são poucos os que já na pós-modernidade faz uma leitura diferente, mais contextualizada da fé cristã.

    No entanto acho que toda mudança exige tempo, creio que a semente da mudança foi plantada na decada de 70 com a TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO (reforma católica...?) e MISSÃO INTEGRAL (Reforma evangélica...?)

    O pensamento teólogico desse periodo em diante produziu mudanças, mas um pouco lenta, algumas lideranças, já estão se contextualizando.

    Fui um dos atingidos por essas duas vertentes do cristianismo! (Estarei postando brevemente na confraria um texto com o tema RUPTURA EPISTEMÓLOGICA NA TEOLOGIA DO TERCEIRO MUNDO)

    Agora...sintetizar simbolos, mesclar a fé cristã com mitos e arquétipos, filosofia shopenhauer, nietschiana, psicologia profunda, freudiana, junguiana e companhia....

    Ai o negócio é diferente... Não é para todo mundo não amigo...Isso é para os amigos da confraria mais alguns que estão nas "cavernas da vida", sendo guardados para o momento oportuno" hahahahahhha

    Não se iluda, modéstia à parte mas o nivel da confraria está ANOS LUZ da maioria dos teólogos brasileiros principalmente os "ortodoxos".

    Finalizo com uma frase que muito me fez rir e refletir:

    "A TRADIÇÃO é a fé viva dos que morreram TRADICIONALISMO é a fé morta dos que vivem"

    Hahahahahaahahhahahhahah
    Abraço.

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  9. JL, vou aguardar seu texto lá na Confraria, que pelo título, vai dar muito o que pensar e discutir.

    Gostei também da frase que tez rir e refletir. rsssss

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