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Jl-reflexoes

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Eu que aprenda... A desejar!


– Um homem tinha dois filhos. Certo dia o mais moço disse ao pai: “Pai, quero que o senhor me dê agora a minha parte da herança.”
– E o pai repartiu os bens entre os dois”.

A parábola narrada por Jesus tem uma dimensão psico-lógica ampla, me vejo nela não somente na condição do filho que sai, mas também no que fica, uma insatisfação crônica na dimensão dos desejos, de forma que dentro dos limites impostos pela minha consciência desejo ficar, mas também desejo sair, me sinto preso por ficar, mas, ainda mais preso se sair.

O meu coração tem duas dimensões:
- Uma que não se satisfaz com o que tem.
- Outra que deseja o que não tem.

Não se basta com o que tem, mas idealiza o que não tem, o batimento traz o ritmo de dois filhos o “eu” que fica insatisfeito com o que tem, e o “eu” quer sair, em busca de satisfazer-se com o que não tem!

Vivo a síndrome da liberdade ideal, quero ser livre, mas sei que no máximo tenho o livre arbítrio, pois a liberdade é invenção, e nunca vai excluir os efeitos das ações. O “eu” insatisfeito que fica às vezes se expressa na indignação, por não ter o que gostaria.

Ao mesmo tempo, o “eu” que deseja sair se perde na conquista, pois não ter o objeto do desejo mantém vivo o objeto e o desejo, a realização pode frustrar, nesse caso mata tanto o objeto quanto o desejo!

A liberdade ideal é ficção, pois ao ser experimentada perde a imagem idealizada, é inatingível, Lacan chama essa busca de objeto “a” quando você chega nele, já não mais está no lugar que estava!

O filho que saiu, sou “eu”, que deseja, luta, conquista, mas ao conquistar percebe que não conquistou, pois a liberdade só existe com limites, sem esses gera frustração, pedir a herança é um ato simbólico de transferência, ter, possuir, tocar em algo que na realidade, é intocável, a sua falta, é essencial, aquilo que não possuo é fundamental para a minha realização.

O filho que saiu, “eu”, não sofre com a falta do que vê e não possui, mas sim por possuir e não ver, alguém já disse: “Como ver aquilo que me é próximo”?

A posse do objeto de meu desejo faz com que não veja o valor do objeto que possuo por isso: Eu que aprenda a desejar...

2 comentários:

  1. Magnífico, seu ensaio psicanalítico sobre os dois filhos da “Parábola do filho pródigo”!


    “Certamente o desenvolvimento do existencialismo e da psicologia profunda tem sido de infinito valor para a Teologia” – Disse certa vez Paul Tillich.

    Você, meu caro J. Lima, se superou, ao se estender na questão dos “desejos” que Lacan tão bem explorou a partir de Freud.

    Esse “desejo” , é mais uma falta de satisfação total que impulsiona o ser humano a tentar achar aquilo que o completaria.
    NO vazio de seu próprio desejo, o indivíduo fica impossibilitado de encontrar o seu ser de gozo. O único remédio é voltar-se para o Pai simbólico.

    O que você escreveu com maestria incomum é, realmente, o que queria dizer o maior dos psicólogos – Jesus Cristo, na Parábola do Filho Pródigo. Eu considero essa história, a maior já criada por um Homem , para metaforicamente, explicar a intricada questão dos nossos desejos frente a autoridade paterna.

    Que venha mais artigos como esse. O presente e o futuro agradecem, (rsrrsrs)


    Levi B. Santos

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  2. Oi J. tudo bem? tô chegando para explorar minuciosamente este teu espaço que já está sendo tão comentado no CPFG: Confraria dos Pensadores Fora da Gaiola...bom, inventei o nome agora, não é muito bom rsssss Por "fora da gaiola", vide um texto no blog do Wagner.

    Essa tensão entre "ficar" e "sair" é um drama existencial poderoso. Como você já expôs muito bem a tensão e o Levi deu aquela pincelada perfeita, como ele sempre faz, vou usar a tensão como símbolo da libertação do "pensamento espiritual".

    O que quero dizer com isso? Simbolicamente, posso ver o filho que ficou como o cristão que sabe que existe "outro mundo" e outras possibilidades espirituais diferentes da dele, mas ele é incapaz de "sair da gaiola" e alçar voo livre. Resguardando, é claro, a ciência de que a liberdade absoluta não existe.

    É claro que há aqueles que nunca pensaram em sair. Eles dependem da segurança da casa do pai. Sair para eles, seria caminhar de encontro à perdição. Esses não possuem nenhuma tensão, estão satisfeitos com a própria falta de auto-crítica, julgam-se detentores da VERDADE que para eles, só pode ser encontrada na casa paterna.

    O filho que saiu, com o qual me identifico, é aquele que ousou pôr de lado sua tradição teológica, sua visão de Deus, de igreja, de espiritualidade e foi buscar novos ares que lhe satisfizessem a cabeça e o coração.

    Quem ficou e é capaz de pensar, mas é medroso, inveja a coragem de quem saiu. E quem saiu às vezes sente falta da segurança da casa paterna. E volta...

    Nesse ponto, o símbolo já não me alcança, pois ainda que eu experimente "comida de porcos", estou cansado do cardápio petrificado que deixei para trás.

    Mas ainda, a "comida de porcos" só carrega um sentido negativo para quem cerimonialmente, não se mistura com ele. Em si, o "porco" não tem nada de "impuro".

    Alguns fundamentalistas que nunca pensaram nem pensarão em sair, podem achar que eu me misturei com porcos; mas na verdade, agora eu sou "livre" para "conversar" e "conviver" com eles.

    Cansei a muito tempo de gente limpinha que se acha perfumada e arrumadinha para agradar ao pai.

    Não leve em conta meus delírios simbólicos rsss

    Ao mesmo tempo, deixo esse comentário para você conhecer um pouco da minha cabeça que não consegue "ficar".

    abraços

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